28 de março de 2024   
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Em primeiro lugar, o Governo da União não pretende a independência do Estado Português da índia, mas a integração dos territórios no seu próprio território, a fusão das populações na sua massa de população. Em segundo lugar, todos poderão aceitar o princípio da autodeterminação dos povos, menos a União Indiana. Quando esse princípio pudesse ser pacificamente invocado e receber satisfação, a União Indiana voltaria rapidamente à poeira de Estados e soberanias e à simples expressão geográfica que, através dos tempos, quase sempre fora. Goa seria ainda Portugal e já as numerosas raças, línguas e religiões do Indostão haviam de constituir bases de edificações políticas muito mais diferenciadas que as nossas províncias ultramarinas.
Nós afirmamos o seguinte: Goa encontra-se ligada, sentimental e patrioticamente, a Portugal, e os goeses não têm mostrado preferir a recente soberania indiana à do velho País que teve, pelo menos, o mérito de, em recuados tempos, abrir à Índia os caminhos marítimos do mundo e pô-la em contacto com a civilização ocidental. Do lado oposto, afirma-se que, se Goa não se tem levantado a favor da sua integração na União Indiana, é que não tem liberdade para isso.
Decido não fugir ao argumento e respondo.
É perfeitamente exacto que no Estado português da Índia não podem os cidadãos portugueses, sem incorrer em responsabilidade, manifestar publicamente preferência pela sua ligação à União Indiana e agir em conformidade com qualquer intento desse género. É assim em Goa; é assim em Portugal inteiro; é assim em todo o mundo, porque a cidadania não é objecto de escolha, mas dever natural de que cada um não pode libertar-se à sua vontade, negando-se à pátria. É assim também na União Indiana, com a estranha agravante de, ao contrário do admitido nos povos civilizados, não poderem ali os goeses manifestar sem risco o seu desejo de que continue portuguesa a sua terra.
Quanto à formação de clero local, devemos nós arrogar-nos o direito de prioridade na matéria. No clero de Goa não chegam a uma dezena os sacerdotes do Continente e Ilhas e andam à roda de 700 os naturais do próprio Estado da Índia. Fora do território português, Goa traz em serviço das missões da Propaganda uns 200 sacerdotes. Que ironia dos factos e que lição! Nós ensaiámos há séculos a novidade — em 1530 já havia sacerdotes indianos — e em Goa pode dizer-se que desde há dois séculos o clero é na sua totalidade goês. E não só para Portugal: generosamente se dispersava e trabalhava também fora do Estado da Índia e fora do Padroado, no exercício de uma missão religiosa, que ainda não pôde ser acusada com verdade de apresentar traço de influência política. Por alguma razão a Goa se tem chamado a Roma do Oriente. É-o de facto pelo esplendor da fé católica, pela abundância das vocações, pelo espírito de proselitismo que anima a Igreja naquelas benditas terras. Por serem da Índia? Meu Deus, não! Por serem portuguesas.
O Plano de Fomento que não fora elaborado para as circunstâncias actuais, mas se casa admiravelmente com as necessidades futuras daquelas populações, encontra-se em plena execução. Das obras hidráulicas para rega, do abastecimento de águas, dos estudos geológicos, das estradas e pontes previstas, dos melhoramentos a introduzir no porto e no caminho de ferro de Mormugão não só hão-de resultar maiores produções e facilidades de vida como decidido incremento de outras fontes de riqueza local. Será pena que a União Indiana pretenda comportar-se como se ignorasse os meios de comunicação que temos ao seu dispor, mas, mesmo sem o tráfego da União, se o mercado internacional continuar a absorver os minérios goeses, especialmente os de ferro, cremos que haverá movimento suficiente para a sua manutenção.
Tudo isto exigiu e continua a exigir atenções e esforços no sentido de alterar os rumos do comércio, substituir as clientelas, modificar as rotas da navegação, resolver problemas de armazenamento e conservação de produtos alimentares. E quando concluirmos a construção do aeródromo de Goa — o tal que se destina, no pensar da imaginativa imprensa da União, a base americana de guerra — e conseguirmos pequenas pistas em Damão e Diu, teremos a possibilidade de ligar satisfatoriamente o Estado da Índia com o mundo, cessando parte do seu forçado isolamento, que no actual momento só podemos quebrar e estamos quebrando por meio das nossas carreiras marítimas ou de barcos estrangeiros em demanda de Mormugão. Os problemas que defrontamos são semelhantes aos que suscitaria um horrível cataclismo que tivesse

(continua)


POLÍTICA ULTRAMARINA (13)

(«O caso de Goa» — Discurso pronunciado na Assembleia Nacional, em 30 de Novembro) – 1954

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Música de fundo: "PILGRIM'S CHORUS", from "TANNHÄUSER OPERA", Author RICHARD WAGNER
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